Cultura!

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OBJECTIVOS

Estes textos são uma mera justificação de gosto, dirigida em primeiro lugar aos amigos, e não são crítica de cinema, muito menos de teatro ou arte em geral... Nos últimos tempos são maioritariamente meros comentários que fiz, publicados principalmente no facebook ou no correio electrónico, sempre a pensar em primeiro lugar nos amigos que eventualmente os leiam.
Gostaria muito de re-escrever os textos, aprofundando as opiniões, mas o tempo vai-me faltando...
As minhas estrelas (de 1 a 5), quando as houver, apenas representam o meu gosto em relação à obra em causa, e nunca uma apreciação global da sua qualidade, para a qual não me sinto com competência, além da subjectividade inerente. Gostaria de ver tudo o que vale a pena, mas também não tenho tempo...

quinta-feira, 13 de novembro de 2014

OS MAIAS, de João Botelho



CINEMA E LITERATURA

A recente visão da adaptação de "Os Maias - Cenas da Vida Romântica", por João Botelho, que uma vez mais demonstra ser um dos nossos melhores realizadores, fez-me pensar nas relações entre a grande Literatura e o Cinema. 

O romance, todos sabemos, quer o tenhamos lido ou não (eu li mais de uma vez e espero ainda rele-lo), é uma das obras-primas absolutas da literatura portuguesa, magistral obra de Eça de Queiroz, na qual, a pretexto de histórias mais ou menos passionais, traça um retrato mordaz dos tempos finais da monarquia, em que grassa a corrupção, a falta de escrúpulos e uma certa dissolução de costumes, embora os heróis do romance sejam apenas personagens quase ingénuas apanhadas pela voragem dos tempos. Nada que seja novo para nós, neste início do século XXI, de novo num período histórico em que as classes mais poderosas voltam a ganhar terreno na luta de classes, tal como nessa época e esperemos que também por pouco tempo, como então...

Sobre o filme apenas meia dúzia de constatações, baseando-me só na versão curta (2h15') já que ainda não vi a integral (mais de 3h) mas que quero ver:

Uma excelente adaptação, que melhorará obviamente na versão integral. Com a utilização quase sempre (ou sempre?) de cenários nas cenas de exteriores, o que se compreende pelas razões económicas óbvias. Aliás cenários excelentes que, em minha opinião, não chocam o espectador, muito pelo contrário, porque também são olhados como obras de arte. Uma belíssima direcção de actores, com alguns consagrados e outros que não conhecia. João Perry, um grande nome do teatro, é magnífico em Afonso da Maia, o avô, os dois amantes (e mais não digo), Maria Flor e Graciano Dias são convincentes e Pedro Inês é um João da Ega simplesmente brilhante, isto para falar só dos principais desempenhos porque há outros verdadeiramente magníficos. João Botelho optou inteligentemente pela existência de um narrador (aliás de uma dicção magnífica, o cantor de ópera Jorge Vaz de Carvalho), permitindo-lhe uma ligação ao texto soberbo do Eça. E conseguiu que o humor quase sarcástico do grande escritor aflorasse por vezes, fazendo-nos sorrir às vezes à beira da gargalhada, perante os ridículos da grande burguesia retratada. 



Noutra ocasião referirei os grandes clássicos da Literatura Universal que o cinema tem adaptado às vezes ao nível da obra literária. Dos grandes clássicos russos (Fedor Dostoievski, Leon Tolstoi, Máximo Gorki, Mikhail Sholokhov, etc e outros mais recentes, Chingiz Aitmatov) que principalmente os cineastas da era soviética adaptaram brilhantemente, aos grandes dramaturgos (William Shakespeare, Tennessee Williams, Anton Tcheckov, Bertold Brecht, Eugene O´Neill, Harold Pinter, John Osborne, etc), aos grandes escritores que cultivaram o policial (Dashiell Hammett, Raymond Chandler, Horace McCoy, Georges Simenon, Ruth Rendell, John Le Carré, etc), aos grandes clássicos (Charles Dickens, Victor Hugo, Thomas Mann, Gabriel Garcia Marquez, José Saramago, Cervantes, Rabindranath Tagora, D.H.Lawrence, etc), aos grandes escritores portugueses (Eça de Queiroz, Camilo de Castelo Branco, José Rodrigues Miguéis, Manuel da Fonseca, Agustina Bessa Luís, Manuel Tiago (Álvaro Cunhal), Carlos de Oliveira, José Cardoso Pires, etc). 

Disso falaremos depois procurando seleccionar as adaptações que vimos e que na nossa opinião são as mais brilhantes. Não devemos esquecer todavia que o cinema tem tido ao longo de mais de um século de história grandes argumentistas, alguns dos quais também foram ou são grandes escritores. Mas isso já será outro domínio.

sábado, 8 de novembro de 2014

HOMENAGEM AO CINEMA

Homenagem ao Cinema através de dez filmes, alguns dos quais nunca veremos nos circuitos comerciais, e muito pouco ou nunca (infelizmente) na Cinemateca, mas de que gosto muito. 
Porque apesar de alguns serem grandes sucessos de público (dos maiores das últimas décadas na nossa cidade) são a antítese do cinema comercial, que em geral muito pouco nos diz, quando não nos irrita. 
Alguns são obras aparentemente muito simples, no entanto são capazes de nos transmitir sentimentos  e factos, fortes, sinceros e verdadeiros. 
São apenas dez exemplos entre muitos possíveis que mostram, cada um à sua maneira, porque gostamos tanto da Arte das Imagens. 
E são todos, na minha opinião, belos e grandes filmes que podemos rever sempre.

ÁGUA E SAL (2001), de Teresa Villaverde
POR
EDUCACIÓN DE LAS HADAS (2006), de José Luís Cuerda
ESP
IL POSTINO (O Carteiro de Pablo Neruda) (1994), Michael Radford
ITA
KAMCHATKA (2002), de Marcel Piñeyro
ARG
KLIMT (2006), de Raoul Ruiz
AUS
LIFE IS A MIRACLE
(A Vida é um Milagre) (2004), de Emir Kusturica
SER
MOTORCYCLE DIARIES (THE) (Diarios de Che Guevara) (2004), de Walter Salles
BRA
NUOVO CINEMA PARADISO (Cinema Paraíso) (1988), de Giuseppe Tornatore
ITA
OLGA (2004), de Jayme Monjardim
BRA
VERA DRAKE (2004), de Mike Leigh
GBR






OBRAS PRIMAS NA CINEMATECA

Para ver (ou rever) na CINEMATECA PORTUGUESA

A obra-prima A MÃE (MAT), de Vsevolod Pudovkine (URSS, 1925), adaptação de outra obra-prima mas da Literatura Universal, o romance homónimo de Máximo Gorki, que Bertold Brecht também adaptou magnificamente ao Teatro ( e nunca é de mais lembrar a belíssima encenação do saudoso Joaquim Benite para a Companhia de Teatro de Almada, com Teresa Gafeira, na protagonista, em mais uma das suas brilhantíssimas interpretações) já foi exibida. Nos próximos dias há outras obras máximas mas vou limitar-me a referir "The River" (O Rio Sagrado) (Fra, Ind, EUA, 1951), do mestre Jean Renoir, que teve nessa obra como assistente de realização outro nome enorme da Sétima Arte, então no seu início de carreira, Satyajit Ray (dia 13, 15.30) e "Zemlya" (Terra), outra obra extraordinária, de Aleksandr Dovjenko (URSS. 1930) (dia 19, 19.00) !
(ver programação completa em www.cinemateca.pt)


quinta-feira, 6 de novembro de 2014

COM TEXTOS NO BLOGUE: ALGUNS GRANDES FILMES




BATTAGLIA DI ALGERI (LA)
A Batalha de Argel (1966)
GILO PONTECORVO
CESARE DEVE MORIRE
 César Deve Morrer (2012)
PAOLO e VITTORIO TAVIANI
CHE (2008)

STEVEN SODERBERGH
CHLEN PRAVITEL'STVA
 Membro de Governo (1940)
ALEKSANDR ZARKHI e
YOSSIF KHEIFITS
FORCE OF EVIL
A Força do Mal (1948)
ABRAHAM POLONSKY
PLAYTIME
Vida Moderna (1967)
JACQUES TATI
SARABAND
Sarabanda (2003)
INGMAR BERGMAN
SOUTHERNER (THE)
Sementes do Ódio (1945)
JEAN RENOIR
TWELVE ANGRY MEN
Doze Homens em Fúria (1957)
SIDNEY LUMET
VELIKIY GRAZHDADIN
O Grande Cidadão (1938)
FRIEDRICH ERMLER




COM TEXTOS NO BLOGUE: FILMES PORTUGUESES DE QUE GOSTO MUITO

48

SUSANA SOUSA DIAS
ATÉ AMANHÃ CAMARADAS

JOAQUIM LEITÃO
DUAS MULHERES

JOÃO MÁRIO GRILO
FELICIDADE

JORGE SILVA MELO
JOSÉ E PILAR

MIGUEL GONÇALVES MENDES
NE CHANGE RIEN

PEDRO COSTA
GEBO E A SOMBRA (O)
MANOEL DE OLIVEIRA

RUAS DA AMARGURA
RUI SIMÕES

TABÚ
MIGUEL GOMES

TERRA DE NINGUÉM

SALOMÉ LAMAS


quarta-feira, 5 de novembro de 2014

CLÁSSICOS DE QUE GOSTO MUITO

1928 The Circus
(O Circo)
CHARLES CHAPLIN
1938 Alekxander Nevski
(Alexandre Nevki)
SERGUEI EISENSTEIN
1941 The Lady from Shangai
(A Dama de Xangai)
ORSON WELLES
1951 The River
 (O Rio Sagrado)
JEAN RENOIR
1954 Shichinin no Samurai
(Os Sete Samurais)
AKIRA KUROSAWA
1956 Det Sjunde Inseglet  
(O Sétimo Selo)
INGMAR BERGMAN
1956 Otto i Mezzo
 (Oito e Meio)
FEDERICO FELLINI
1960 Rocco i Suoi Fratelli
(Rocco e Seus Irmãos)
LUCHINO VISCONTI
1964 Charulata

SATYAJIT RAY
1999 Eyes Wide Shut
De Olhos Bem Fechados
STANLEY KUBRICK


terça-feira, 4 de novembro de 2014

OS DEZ MESTRES DA SÉTIMA ARTE MEUS PREFERIDOS

CHARLES CHAPLIN
Walworth, GBR, 16-Abr-1889
 25-Dez-1977
Modern Times
(Tempos Modernos) (1936)
FEDERICO FELLINI
Rimini, Roma, 20-Jan-1920
 31-Out-1993
La Dolce Vita
 (A Doce Vida) (1960)
INGMAR BERGMAN
Uppsala, Suécia, 14-Jul-1918
Farö, Suécia, 30-Jul-2007
Fanny och Alexander
(Fanny e Alexandre) (1982)
JEAN RENOIR
Montmartre, Paris,  15-Set-1894
 12-Fev-1979
La Règle du Jeu
 (A Regra do Jogo)(1939)
KENJI MIZOGUCHI
Hongõ, Tóquio, 16-Mai-1898
 24-Ago-1956
Ugetsu Monogatari
(Os Contos da Lua Vaga) (1953)
LUCHINO VISCONTI
Milão, 2-Nov-1906
 17-Mar-1976
Il Gattopardo
(O Leopardo) (1963)
ORSON WELLES
Kenosha, Wiscosin, 16-Mai-1915
 10-Out-1985
Citizen Kane
(O Mundo a seus Pés) (1941)
SATYAJIT RAY
Calcutá, 2-Mai-1921
 23-Abr-1992
Trilogia Apu (1955-1959)
SERGUEI EISENSTEIN
Riga, Letónia, 22-Jan-1898
Moscovo, 11-Fev-1948
Bronenosets Potiomkin
(O Couraçado Potemkine) (1925)
STANLEY KUBRICK
Manhattan, NYC, 26-Jul-1928
 St.Albans, GBR, 7-Mar-1995
2001, A Space Odyssey
 (2001- Odisseia no Espaço)(1968)



segunda-feira, 3 de novembro de 2014

PEQUENAS MEMÓRIAS CINÉFILAS

As salas de cinema que marcaram a minha infância, adolescência e juventude, cinéfilas, estão muito ligadas às obras que nelas vi e que decerto modo também contribuíram (julgo que bastante) para a formação do ser humano que sou.

Sem consultar os meus arquivos, que são reduzidos com excepção de os da minha paixão cineclubista, poderia recordar de memória o Stadium (do SAD), o Restelo, o Promotora, o Paris, o Europa, o Jardim-Cinema e os cinemas do centro da cidade de Lisboa, e quase todos os que mais frequentei já estão há muito desaparecidos - o Estúdio do Império, o 444, o Apolo 70, o Londres, o Roma (agora auditório), o Tivoli (agora teatro), o São Luís (agora teatro), o Éden, o Condes, o Império, Monumental e S.Jorge, mais tarde o Alvalade, ao cimo da Avenida de Roma (hoje é o City-Cine), o Universal (na Rua da Beneficência), o Lys, etc, etc (deve faltar muita coisa).

E o Imperial, de que junto imagem actual do que resta do edifício onde funcionou, tirada outro dia, quando numa das minhas deambulações citadinas lá passei.



No Imperial decorreram durante alguns anos (anos 60 e talvez 70) as sessões semanais do CCUL (Cine Clube Universitário), um dos vários cineclubes então existentes em Lisboa. 
Os mais importantes eram o Imagem, o ABC, o CCUL, o Católico (e aqui julgo que chegou a haver dois - o dos católicos progressistas e o dos católicos fascistas. Nunca fui nem a um nem a outro...). 

E no CCUL (mas também no ABC e IMAGEM), e no cinema IMPERIAL, vi algumas das obras mais importantes da 7ª Arte.

Só relembrando algumas: o cinema inglês, de Losey aos Angry Men; o neo-realismo italiano; alguns clássicos do cinema soviético    (que conseguiam escapar à censura, embora retalhados); a nouvelle-vague francesa e alguns grandes clássicos, como Renoir; o cinema de esquerda feito nos EUA (Richard Brooks e outros); o cinema espanhol anti-fascista que ultrapassava a censura, o cinema novo português e os seus antecessores (Manuel Guimarães, Artur Ramos); o cinema europeu dos países socialistas (principalmente checo, húngaro, polaco).

Inesquecíveis, a exibição com grande sucesso de uma obra-prima "O Faraó", de Kawalerowicz e também o impacto na jovem assistência que enchia por completo, como quase sempre, a grande sala do Imperial, do longo travelling final de Os Quatrocentos Golpes, de François Truffaut. 

Eram frequentes os aplausos no final da sessão da maioria dos jovens presentes. Julgo que seriam 3 ou 4 centenas.



  

domingo, 2 de novembro de 2014

ALENTEJO, ALENTEJO, de Sérgio Tréfaut

NOTAS CINÉFILAS (só do que me interessa e gosto muito e que não posso deixar passar sem uma referência...)

ALENTEJO, ALENTEJO, de Sérgio Tréfaut

Amig@s, já viram este belíssimo documento sobre o Alentejo, os alentejanos e o seu cante? Por favor não percam.

Só vos digo que começa brilhantemente e tem ao longo do filme cenas que nos comovem mas não só pela sua beleza.
Tréfaut realizou um dos mais belos documentários que vimos ultimamente. 

É que ao mostrar o Cante, esse cantar alentejano por excelência que, pela sua originalidade e beleza, merece indiscutivelmente estar na lista daquilo que deve ser considerado como pertencente ao património cultural e inalienável da Humanidade, mostrou a cima de tudo o Povo que o canta, dos mais jovens aos mais velhos, do Alentejo à Diáspora. 



Julgo ser impossível, quando há sensibilidade e inteligência suficiente, ficar indiferente a isto.

No entanto, ao pé de tanta inutilidade que enche a maioria dos ecrãs da nossa cidade (claro que não falo de Satyajit Ray, Alain Resnais, Woody Allen, João Botelho, Joaquim Pinto e alguns mais), a obra de Tréfaut mereceria outra audiência e não só aquelas dezenas de espectadores, por muito bons que alguns sejam, presentes na sessão a que assisti, naquele enorme cine-multiplex cheio das tais inutilidades... Quanto à crítica dominante, bom, esqueçam: tem o cinema que merece...




sábado, 1 de novembro de 2014

LA CHAMBRE BLEUE (O Quarto Azul), de Mathieu Amalric


NOTAS CINÉFILAS (só sobre o que me interessa e gosto muito e que não posso deixar passar sem uma referência...)


O QUARTO AZUL (La Chambre Bleue), de Mathieu Amalric

Adaptação do romance homónimo (publicado inicialmente sob o título "Les Amants Frénétiques") de Georges Simenon (Liège, 13-Fev-1903 - Lausanne, 4-Set-1989). 

Gosto muito do escritor e não sou o único, felizmente: « (...) Simenon é uma espécie de Balzac (menor, se insistirem nisso, embora me pareça que em matéria de méritos artísticos e literários é difícil ir a meças), mas um Balzac da pequena e média burguesia da primeira metade do século (XX) » (Correia da Fonseca, À Espera de Simenon, em O Diário, de 9-Jul-1988)

Julgo que Mathieu Amalric, o magnífico actor e também realizador, e que nesta obra surge nas duas funções, traduziu o essencial da trama desta estória de paixão e destino trágico, a que os dois amantes não conseguem escapar. 

Mas, ao contrário das histórias policiais de Simenon, em que a principal figura é o Comissário Maigret, nesta a verdadeira solução do crime não será conhecida do espectador (ou leitor). 

Culpados os dois, ou só um, ou alguém mais, ou outra pessoa? A dúvida permanecerá. Mas as grandes paixões, a contra-corrente, obsessivas, ilógicas (?), tendem quase sempre para a tragédia. E os amantes, perante as provas circunstanciais que a sociedade ajuíza em geral tendenciosamente, acabarão condenados.

Concordo com uma crítica que li que referia a influência de Chabrol nesta obra de Mathieu Amalric, na sua descrição de um meio burguês de província. O que é um elogio, em minha opinião.

De início o espectador poderia pensar que se tratava de uma obra em que o sexo estaria sempre em grande plano, e afinal não é assim, embora seja o cerne da obra e haja meia dúzia de cenas eróticas que ficam na memória, emblemáticas, como a da abelha. 



Os actores principais, duas mulheres e um homem, que constituem o núcleo dos pares à volta dos quais decorre o drama são excelentes, Mathieu Amalric (Julien Gahyde), Léa Drucker (Délphine Gahyde), Stéphanie Cléau (Esther Despierre), e mais alguns secundários magníficos. Stéphanie colaborou com Mathieu na escrita do argumento, adaptação do romance. 

A propósito, confesso que também aprecio muito a longa série de pequenos romances centrados na figura de Maigret. Para além da quase bonomia com que trata os, quase sempre pequenos, criminosos que com ele se cruzam, na tentativa de lhes compreender as razões e motivações, reveladoras das misérias e infelicidades que afligem o ser humano, outra característica maior do romancista é, em minha opinião, a sua magnífica e principalmente fascinante descrição de ambientes. 

Quer de uma Paris que o autor e respectivas personagens conhecem bem, quer das suas incursões pela província, em especial das que se passam na sua Bélgica e Flandres natal, quase sempre com um rio de águas invariavelmente lodosas e escuras, que atravessa as cidades, e por onde sobem ou descem barcaças.

Nota pessoal:

Quando relembro os romances com Maigret e os seus ajudantes, e a Madame Maigret, quando penso no Quai des Orfévres, recordo uma deambulação por esses lados, provavelmente a tentar sentir também na pele as descrições de Simenon e lembro o susto de uma idosa transeunte quando lhe perguntámos se sabia onde era. Temendo ser assaltada naquela zona de grandes edifícios, quase deserta? Foi o que me pareceu. 

Estávamos em meados dos anos 70, quando já grande parte dos emigrantes portugueses havia regressado à pátria, cheios de novos sonhos, afastados dos bidonvilles, esses enormes bairros de barracas e lama, que as autoridades francesas haviam desmantelado à pressa, tentando apagar os vestígios da emigração a que o fascismo português obrigou o nosso povo.

Agora, passados 40 anos, uma nova geração de portugueses é obrigada a emigrar por políticas semelhantes às de então. Na história da Luta de Classes, trata-se de um enorme retrocesso, mas todos sabemos que mais tarde ou mais cedo a roda da História voltará a mover-se no sentido do progresso social, da liberdade e da igualdade, e isso será obviamente consequência da Luta dos Povos.




MAIDAN, de Sergei Loznitsa

Pela sua importância recomenda-se vivamente a leitura do artigo "A Verdade e a Mentira no Cinema", de Manuel Augusto Araújo

"(...) Todo o filme é construído para nos transmitir as emoções daqueles meses, manipulando o enorme poder das imagens. Quase se acredita que Sergei Loznitsa quis reflectir sobre «a insurreição popular, enquanto fenómeno social, cultural e filosófico». Utiliza esse caldo de cultura para fazer um filme de propaganda de um suposto levantamento popular espontâneo. A UE, os EUA, os seus títeres ucranianos encontraram a sua Leni Riefensthal doblez, com muito menos talento, mas bastante saber cinematográfico."

Manuel Augusto Araújo, no Avante! nr.2135

http://www.avante.pt/pt/2135/argumentos/132687/


O DEUS ELEFANTE (JOI BABA FELUNATH), de Satyajit Ray

NOTAS CINÉFILAS (só sobre o que me interessa e gosto muito e que não posso deixar passar sem uma referência...)

O DEUS ELEFANTE (Joi Baba Felunath) (1979), de Satyajit Ray, visto no mini-ciclo sobre este autor, actualmente no Cinema Nimas, em Lisboa. Depois seguirá para o Carlos Alberto, no Porto (amig@s portuenses, se tiverem disponibilidade por favor não ignorem este acontecimento)

Eram 6 os filmes restaurados deste grande mestre e consegui (!!!) ver todos. Ele não tem filmes fracos (que eu conheça) e este é mais uma daquelas jóias que nos dá muito prazer ver. Argumento mais ou menos policial de quem cultivou, na escrita, também essa faceta (que não conheço, até porque, segundo li no DN, não está traduzido em português). 
A estória do filme gira à volta do roubo de uma pequena imagem em ouro, muito valiosa, do Ganesha, o Deus Elefante. Roubo que vai ser investigado pelo detective criado por Satyajit Ray, Feluda, magnificamente interpretado pelo nosso já conhecido de outros filmes de Ray, Soumitra Chatterjee.

Não percam.


E já agora, para quem o puder fazer, ainda há possibilidade de ver todo o ciclo: sexta - A Grande Cidade, sábado - O Cobarde, domingo - O Santo, segunda - O Herói, terça - O Deus Elefante e quarta - Charulata. 
Os mais importantes e obras-primas são A Grande Cidade, Charulata e O Herói, mas, se pudesse, reveria sem hesitações todos eles.






MITT ANDRA LAND (O MEU OUTRO PAÍS), de Solveig Nordlund

NOTAS CINÉFILAS (só sobre o que me interessa e gosto muito e que não posso deixar passar sem um referência)

MITT ANDRA LAND (O Meu Outro País)

A última obra de SOLVEIG NORDLUND (Estocolmo, 9-Jun-1943), realizadora e encenadora, com vários trabalhos, no cinema e no teatro, de que gostamos muito. 



Vimos este filme no Doclisboa que está ainda a decorrer, numa montagem de obras suas e de outros cineastas seus contemporâneos, nomeadamente Alberto Seixas Santos, Robert Kramer, bem como de documentários sobre os anos da Revolução de Abril, principalmente os do Grupo Zero, entre outros. Solveig chegou a Portugal nos anos 60 e depois fez quase toda a sua obra aqui. 

Ela fala sobre o que mais impressionou na sua vida em Portugal e da Revolução a que assistiu e que diz não esquecer mais, tal como nós, para quem esses foram os tempos mais felizes da nossa vida. 

Este filme tem momentos emocionantes, principalmente da mais bela das conquistas da Revolução, a Reforma Agrária, iniciada em 9 de Fevereiro de 1975. Fantástica a longa sequência da manifestação em apoio à Reforma Agrária, com o desfile dos representantes das UCPs, retirado de um dos documentários de época que a Solveig escolheu. 




Por tudo isto sugerimos aos(às) Amig@s que não percam esta obra quando voltar a ser exibida. 

No final da sessão realizou-se um debate entre os presentes sendo de salientar, naquele a que assisti, um belíssimo testemunho de uma espectadora, que falou principalmente da Reforma Agrária, aliás aplaudido por grande parte dos presentes,

NOTA. fui ao sítio da imdb.com, conhecida base de dados sobre cinema, procurar informações sobre a ficha técnica de Mitt Andra Land e verifiquei, um pouco surpreendido (pouco porque já não é a primeira vez e sempre em casos de obras notáveis, mas que fogem do campo do essencialmente comercial) que não havia sequer registo... 

NÃO PERCAM! 

(nota que publiquei no facebook)

CHARULATA, de Satyajit Ray

NOTAS CINÉFILAS (só sobre o que me interessa e gosto muito e que não posso deixar passar sem uma referência...)

CHARULATA (1964), de Satyajit Ray, visto no mini-ciclo sobre este autor, actualmente no Cinema Nimas, em Lisboa. Depois seguirá para o Carlos Alberto, no Porto (amig@s portuenses, se tiverem disponibilidade por favor não ignorem este acontecimento)

Esta é uma das obras-primas absolutas deste grande realizador indiano (Cálcuta, Bengala, 2-Mai-1921 - 23-abr-1992), "um dos maiores realizadores da história do cinema, tanto indiano como mundial", conforme escrito no magnífico catálogo da Cinemateca Portuguesa, "Cinemas da Índia", aliás um dos melhores, em minha opinião, publicados pela instituição. 

Coordenado por José Manuel Costa e editado em 1998 com apoio do MC (Ministério da Cultura), MC que o (des)governo actual, de cavaco, passos e portas, num miserável acto anti-cultura, eliminou. 

Charulata, é uma adaptação de um romance do prémio Nobel, Rabindranah Tagore (Calcutá, 7-Mai-1861 - 7-Ago-1941), belíssimo retrato de mulher, onde a muito bela Madhabi Mukherjee (Calcutá, 10-Fev-1942), grande actriz já nossa conhecida de "A Grande Cidade" (1963), tem outro desempenho inesquecível.



O romance passa-se no início do século XIX, em meios progressistas indianos, que acompanhavam com interesse e emoção o que se passava na potência colonizadora, a Grã-Bretanha, com a realização das eleições em que o conservador Disraeli, um dos expoentes políticos do imperialismo britânico, seria derrotado pelo político liberal Gladstone, o que os progressistas indianos comemoraram, pensando que isso corresponderia a um abrandamento da exploração e repressão colonial (diálogos da obra).

Há também uma referência a um político progressista indiano, Roy, cujo túmulo se encontra em Bristol e mais de um século antes da independência da Índia (1947) os mais esclarecidos verberam esse facto: "se quizermos homenagear Roy teremos que ir a Inglaterra!"

Gostaria de pedir aos amig@s que não percam esta obra-prima admirável, que se vê também com muita emoção. 

O cinema tem uma característica que ninguém desconhece: o que se passa no ecrã, sabemos que é ficção, mas faz-nos pensar na vida real, nos amigos e nos que nos rodeiam e é possível que algumas lágrimas teimosas se soltem dos olhos mais sensíveis.

A 33ª SEMANA CULTURAL no 45º aniversário do INTERVALO GRUPO DE TEATRO

NA SEMANA CULTURAL DO INTERVALO GRUPO DE TEATRO

O Intervalo foi fundado em 1969, em Algés, portanto há 45 anos, em pleno fascismo e apesar da censura, das perseguições, de algumas prisões, resistiu até ao 25 de Abril e continua vivo e recomenda-se. 

Armando Caldas fazendo a apresentação da sessão

(I) 1º e 2º Dias

Este ano já lá estiveram os actores Carlos Santos e Virgílio Castelo, o director da CTA e do Festival de Teatro de Almada, Rodrigo Francisco, a professora universitária e teatróloga, Maria Helena Serôdio (que escreveu em minha opinião o mais belo texto que li sobre o Festival de Teatro de Almada), os cantores Carlos Mendes, Jorge e Vicente Palma. 
Sessões a que assistimos com grande prazer, com destaque para a excepcional actuação de Jorge Palma, mesmo com a voz em extrema dificuldade, mas não querendo deixar de estar presente e acabando por protagonizar um daqueles momentos inesquecíveis de que o Armando Caldas nos fala. 

Ainda vão ser homenageados este ano Samuel, Janita Salomé, Eduardo Gageiro e Mário de Carvalho, cantores, fotógrafo e escritor, todos acompanhados de vários artistas e personalidades.

A semana finalizará no domingo, às 16.00, com a representação da peça em cena há cinco meses no Intervalo Grupo de Teatro, "Eu é que sou o primeiro", do dramaturgo norte-americano, Israel Horowitz. Peça de grande sucesso, com duas e três décadas de representações em Londres, Paris e Nova-Iorque. Com a curiosidade, principalmente para os desportistas, de Israel ser um maratonista de pelotão e ser casado com uma antiga campeã da maratona. Mais uma razão para não faltarem portanto. Talvez tenha acontecido (não em admirava nada, embora o ambiente no pelotão seja o oposto do da peça) que o argumento da peça lhe tenha surgido e sido desenvolvido no decorrer dos treinos para as maratonas ou até no decorrer de uns 42,195 km... Dela já falámos anteriormente.

II) 3º e 4º Dias

Ante-ontem foi o Samuel, com o Manuel Freire. E foi muito bom, segundo nos disseram porque não pudemos estar presentes por termos ido para outra homenagem, o prémio de carreira dado pela APC (Academia Portuguesa de Cinema) ao nosso querido Amigo Henrique Espírito Santo. 

Ontem regressámos para assistir a mais uma pequena maravilha que foi o concerto dos manos Salomé (Janita e Vitorino) e seus acompanhantes, que terminou com uma GRÂNDOLA com o coro do público, vibrante e emocionante. 

Do que foi cantado muito haveria a dizer, pela sua enorme qualidade e beleza, com a novidade (para nós) das belíssimas canções sefarditas que como o Janita muito bem disse nada têm a ver com o sionismo, nem com a sua política criminosa.
Janita contou com a presença de um grande jornalista da rádio, António Macedo, da RDP - Antena Um, uma magnífica presença quotidiana durante a semana no programa da manhã. 
António Macedo falou de Janita e foi pretexto também para falar da Rádio, no que foi aliás acompanhado pelo Armando Caldas e esse foi outro grande momento da noite, especialmente para todos nós para quem a Rádio continua a ser um dos meios de comunicação preferidos, em especial a Antena Um, que permanece, apesar de tudo, relativamente imune à mediocridade vigente que tudo invade em especial a televisão (porque dá mais dinheiro, claro). 
Mais uma inesquecível sessão de Cultura do Intervalo dirigido por Armando Caldas. Bem hajam!

5º Dia

Foi mais uma noite magnifica de Cultura (e de afectos e emoções) a que se viveu ontem na 33ª Semana Cultural do Intervalo Grupo de Teatro.
A homenagem foi ao maior (na minha opinião e não só) dos nossos Fotógrafos, cuja dimensão é aliás universal, ao lado daqueles de que mais gosto - Doisneau, Ronis, Rodchenko, Cartier-Bresson, Salgado, Brandt, entre outros.
As intervenções sobre a vida e obra do homenageado estiveram a cargo do jornalista Fernando Dacosta e do também jornalista e escritor, Baptista-Bastos, referência maior das nossas letras e cidadania, e última vítima conhecida, há poucos dias, de uma censura que cresce assustadoramente, com pezinhos de veludo, nos jornais dominantes (despedimento do DN) e na sociedade em que vivemos. 
Dele reafirmou Correia da Fonseca, o jornalista co-fundador do Intervalo Grupo de Teatro há 45 anos e que então se chamava 1ºActo, que BB é o maior cronista português vivo. Concordo!
Ele e Gageiro são dois Homens que muito admiro, desde que conheci as respectivas obras, há muitos anos, ainda nos tempos de um passado, medíocre e tenebroso, contra o qual foram Resistentes.
Haveria muito a dizer sobre eles, o que obviamente não é compatível com o pequeno espaço de uma nota facebookiana.
Sobre o homenageado principal, Eduardo Gageiro, Fotógrafo de Abril, que na madrugada início da libertação, avançou sem medo para as ruas, fotografando os alvores da Revolução que haveria de vir com o apoio popular. Depois foram as fotografias que mais ou menos todos conhecemos, entre as quais obras-primas que não nos cansamos de olhar.
A obra de Gageiro é um admirável retrato das gentes do seu país, por vezes as mais anónimas e sofredoras, mas nesse olhar há acima de tudo um universalismo admirável que o tornam tão grande. Impossível desfolhar os seus álbuns sem uma profunda emoção.
A terminar seria imperdoável não referir a parte musical da noite, em que participaram dois grandes nomes da Música Portuguesa da actualidade: um mestre da guitarra, Pedro Jóia e uma impressionante voz do fado, Ricardo Ribeiro. Foi magnífico!

6º e 7º Dias

A 33ª Semana Cultural do 45º aniversário do Intervalo Grupo de Teatro aproxima-se do fim. 

Esta tarde será o dia do teatro, com o último trabalho da companhia,a peça "Eu é que sou o primeiro" (LINE), de Israel Horowitz, que aliás já víramos no início deste ano mas que vamos voltar a ver com muito agrado.



Ontem foi dia da homenagem a um dos grandes escritores portugueses vivos, Mário de Carvalho, que tanto apreciamos, o autor, entre outras obras, das obras-primas da Literatura Portuguesa, "Um Deus Passeando pela Brisa da Tarde" e "A Sala Magenta", a que queremos voltar. 


A sua obra foi analisada por outro excelente escritor e poeta, Domingos Lobo, cuja produção literária conhecemos e apreciamos, incluindo a sua vertente dramatúrgica, tal como os seus ensaios de crítica literária, que nunca deixamos de ler, publicados no Avante!
Mas desta vez Domingos Lobo ofereceu-nos uma lição de sapiência sobre a obra de Mário de Carvalho, o que pessoalmente achei magnífico, mesmo sabendo que ajuda para a sua compreensão integral o conhecimento da obra do homenageado. Foi um momento de cultura magnífico.

Na participação musical da noite, desta vez dedicada à música erudita, estiveram outros dois "velhos amigos" (ainda que nunca tivéssemos falado com eles). É que a vida tem destas coisas: os amigos para nós podem também ser os que nos vão dando momentos magníficos através do seu trabalho, artístico neste caso. E o que lhes podemos dar em troca é o nosso grande aplauso e admiração: o maestro e pianista João Paulo Santos e o tenor Carlos Guilherme.

E quanto a amigos, nunca estivemos sós durante esta semana porque sempre grandes amigos nos acompanharam nas deslocações ao auditório e isso é muito bom!