Cultura!

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OBJECTIVOS

Estes textos são uma mera justificação de gosto, dirigida em primeiro lugar aos amigos, e não são crítica de cinema, muito menos de teatro ou arte em geral... Nos últimos tempos são maioritariamente meros comentários que fiz, publicados principalmente no facebook ou no correio electrónico, sempre a pensar em primeiro lugar nos amigos que eventualmente os leiam.
Gostaria muito de re-escrever os textos, aprofundando as opiniões, mas o tempo vai-me faltando...
As minhas estrelas (de 1 a 5), quando as houver, apenas representam o meu gosto em relação à obra em causa, e nunca uma apreciação global da sua qualidade, para a qual não me sinto com competência, além da subjectividade inerente. Gostaria de ver tudo o que vale a pena, mas também não tenho tempo...

quarta-feira, 20 de junho de 2018

WEST SIDE STORY (Amor Sem Barreiras), de Robert Wise e Jerome Robbins



WEST SIDE STORY (Amor Sem Barreiras) (1961) 

de Robert Wise e Jerome Robbins, música de Leonard Bernstein, letras de Stephen Sondheim, coreografia de Jerome Robbins, genérico de Saul Bass, interpretação de Natalie Wood (Maria) à frente de um magnífico conjunto de actores 






Esta é só uma pequeníssima nota introdutória porque assim que puder gostaria muito de ser capaz de defender esta maravilhosa obra, que ainda hoje entusiasma e emociona até às lágrimas plateias com alguma cultura (visto em ecrã gigante no grande auditório do CCB quase cheio), contra a opinião de alguns gurus da crítica de cinema que, suspeito, foi a questão ideológica subjacente, a crítica ao racismo e à desigualdade social da sociedade norte-americana, expressa até na composição dos grupos constituídos por jovens oriundos das classes trabalhadores ou de famílias imigrantes, neste caso de origem hispânica como os norte-americanos dizem, o que mais os feriu embora não o referissem, dada a conhecida simpatia pela política norte-americana que esses gurus têm. 

Os autores da obra preferiram apelar à sensibilidade e inteligência dos espectadores em vez de fazerem grandes discursos, nomeadamente com a canção "América", que não devemos ter ouvido traduzida na íntegra na versão que passou em Lisboa na estreia (já não me lembro), e na dramática cena final quando o corpo do jovem amante é levado em ombros por elementos dos dois grupos, o dos "americanos" e dos imigrantes porto-riquenhos. 

Nem Natalie Wood aliás esses gurus poupam, apesar de surgir esplendorosa na cena inicial do baile, vestida de branco e depois na cena final da morte de Tony (Richard Beymer), vestida de vermelho. Um aspecto que continua a impressionar é que, tirando Natalie Wood, uma actriz consagrada, a maioria dos outros são jovens actores e actrizes em início de carreira ou secundários excelentes (os polícias, o dono do bar) o que cria à interpretação uma rara homogeneidade, sem vedetismos. 

No final, rompendo a tradicional reserva dos espectadores de uma sala escura perante uma obra que corre no ecrã, o público aplaudiu, o que não deixa de emocionar!

(texto escrito no Facebook, em 17-Jun-2018) 







quinta-feira, 7 de junho de 2018

O TINTEIRO, de Carlos Muñiz

MEMÓRIA

“O TINTEIRO”, de Carlos Muñiz, encenação de Armando Caldas, Intervalo Grupo de Teatro 

O autor, Carlos Muñiz (Madrid 1927-1994), é um nome importante da renovação do teatro espanhol, nos anos 60, a despeito da feroz censura fascista nesses anos, em Espanha, como em Portugal. 

A peça foi publicada em 1961 e estreada em 15 de Fevereiro de 1961, no Teatro Recoletos, em Madrid, com encenação de Júlio Diamante. No mesmo ano, uma das mais importantes companhias na história do Teatro Português, o Teatro Moderno de Lisboa (1961-1965), sociedade constituída por alguns dos melhores actores do seu tempo, iniciou a sua actividade com a representação de “O Tinteiro”, no Cinema Império, em Lisboa, com encenação de Rogério Paulo, tendo-se mantido em cena com enorme sucesso, cerca de um ano. A peça viria a ser representada também em vários países europeus. 

O que é surpreendente é que, quase cinquenta anos passados, esta obra continue a emocionar-nos fortemente, sem dúvida também devido ao magnífico trabalho de encenação e representação, de agora. 

Farsa, chamou-lhe o autor, que com esta peça deixou o realismo social das suas peças anteriores, para se inserir também no campo do expressionismo e do teatro do absurdo, não estando ausente um humor quase trágico, por vezes. 

Mas a “denúncia da opressão, da intransigência e dos absurdos da sociedade” (tão presentes na Península Ibérica da época), que caracteriza as obras deste autor, é fortíssima nesta peça. 

A tragédia de um homem comum, sensível ao que o rodeia, e ao belo, esmagado por uma sociedade sombria e repressiva, que se serve do pior dos homens para oprimir os seus semelhantes, é por um lado comovente e por outro incita à luta pela transformação deste estado de coisas. 

O fascismo ibérico acabou por ser derrubado, primeiro em Portugal, com a Revolução de Abril. E o ambiente social retratado em “O Tinteiro” parecia não poder voltar. 

Todavia, embora, felizmente, já não vivamos, em muitos aspectos, numa sociedade assim, há indícios inquietantes de que essa mentalidade não foi erradicada da sociedade e, se observarmos hoje o que se passa nalgumas grandes (e não só) empresas privadas, verificamos que continua a existir um ambiente repressivo e autoritário, que gera o medo da arbitrariedade e da prepotência e da consequente ameaça latente sobre o lugar de trabalho. E mesmo, na esfera pública, os recentes acontecimentos na Educação (e noutros domínios – Saúde, etc), com os projectos do governo Sócrates, entre os quais o da avaliação dos professores, fazem lembrar o passado, com o controlo do comportamento, que então se pretendia rigidamente dentro da norma e da obediência subserviente ao poder instituído. 

Por isso a peça volta a provocar hoje esta emoção, e não só naqueles que viveram aquela época sombria e trágica da nossa história, como pudemos constatar nos jovens presentes. 

Um belíssimo espectáculo, para o qual a encenação (Armando Caldas, um dos fundadores do TML, que, em 1961, participou como actor em “O Tinteiro”) e a representação (notáveis Carlos Vieira de Almeida (Crock) e Fernando Tavares Marques (Amigo), entre outros) muito contribuíram. 

(texto escrito em 17-Mar-2008. Visto no Auditório Municipal Lourdes Norberto, em Linda-a-Velha)