SOBRE
O CINEMA EM EXIBIÇÃO EM LISBOA
(1)-O
QUE JÁ VI E GOSTEI
(1.1)
– DE VISÃO RECENTE
FILOMENA,
de Stephen Frears (***)
Realizado por um
cineasta inglês (como Steve McQueen), com um “savoir faire” inegável, mas com
obras algo desiguais. Para mim as melhores são o seu famoso “Ligações
Perigosas” e o excelente “Liam”.
Agora trata-se de uma
obra muito interessante sobre famílias desfeitas, tendo como pano de fundo o
que se passava na igreja católica,
irlandesa e não só, em meados do século XX. O seu fundamentalismo, responsável pelos crimes cometidos por
membros da sua hierarquia, que vão da venda de crianças à pedofilia, passando
pela escravatura de jovens mulheres entregues às instituições religiosas.
Frears adaptou um
relato jornalístico sobre um facto real, escrito por um jornalista britânico,
ex-acessor (depois despedido) de um PM de triste memória, em especial pelos
seus envolvimentos com os EUA e a CIA, Tony Blair.
Um outro aspecto que
este filme também refere, de passagem, é a posição da direita norte-americana
(Partido Republicano, em especial) em relação ao tratamento dos doentes com
SIDA (AIDS), contribuindo, tal como a
Igreja Católica, para a sua fatal propagação. Crimes contra a Humanidade que
têm aliás sido silenciados nos Media controlados pelo actual poder económico e
político de direita. Nesta história, real de acordo com a ficha tecnica, é
afinal um jovem membro daquele partido de direita, quase sempre extremista, que
por ironia, acaba também por ser vítima da política que defendeu para a saúde (assesor
do Bush Pai) ...
Com excelentes
actores: a veterana actriz de teatro e de cinema, Judi Dench, com pelo menos
dois desempenhos notáveis que eu conheça no cinema, em obras de Richard Eyre
(Note on a Scandal) e James Ivory (A Room with a View) e o actor Steve Coogan,
menos conhecido mas aqui também magnífico, entre outros.
LOBO DE WALL STREET (O)
(The Wolf of Wall Street), de Martin Scorsese (****)
Desta vez os protagonistas
são os novos gangsters de colarinho branco, responsáveis pela miséria de
milhões e a morte de muitos milhares de cidadãos e a correspondente criação de
alguns novos milionários, que Scorsese retrata.
Mas matanças já não
são ao estilo de Chicago. Agora matam ainda mais pelo desemprego, pela falta de
apoios sociais, pela falta de apoio à saúde, pelo despejo da casa... num
retorno às políticas mais agressivas do sistema económico em vivemos, assente
na exploração dos trabalhadores. E continuam a matar muito.
Só dois aspectos mais:
se por um lado as fortunas destes candidatos a multimilionários crescem como
cogumelos num solo pútrido, o da sociedade capitalista, por outro a principal
personagem do filme, um corrector de Wall Street, aliás real, é de origem
social atípica, provindo não do seio da grande burguesia donde saiem habitualmente
os que têm sucesso na banca e no mundo financeiro, mas dos extractos sociais desfavorecidos, vítimas da exploração e da
pobreza. Por isso, como no filme, são candidatos também à queda a prazo. E
quando caiem denunciam os seus pares, como no filme, procurando sobreviver.
Realizado com a
mestria habitual deste grande cineasta estado-unidense, desta vez num estilo
muito directo, muitas vezes mal educado e rude, como os seus personagens,
envolvidos nos negócios das Bolsas, da especulação financeira e da corrupção,
no sexo sem limites e nas drogas.
(2)
OS OUTROS, JÁ VISTOS HÁ MAIS TEMPO
BLUE JASMINE, de Woody
Allen (****)
Notável obra sobre os
reflexos da crise capitalista nos EUA. Talvez seja um dos filmes mais
claramente políticos deste brilhante intelectual estado-unidense, ou deveria
dizer, nova-iorquino manhattanense?
A ascensão e queda
duma pequena burguesa (Jasmine) e dos seus pares (o companheiro metido nos
esquemas fraudulentas da alta finança e das bolsas, que passámos também
infelizmente a conhecer), em plena crise capitalista. Mais trágico que irónico.
DOZE
ANOS ESCRAVO (12 Years a Slave), de Steve McQueen (*****)
Um filme magnífico
sobre a escravatura nos EUA, de um artista na área das artes visuais (pintura,
instalações), que faz aqui mais uma incursão brilhante no cinema, a terceira,
depois de uma estreia excepcional com “FOME” (Hunger).
Os acólitos do
Império, na crítica dos jornais, obviamente que não gostaram. Mas não é só
tematicamente que o filme é importante, mas também pela qualidade da linguagem.
Mas nem isso “eles” lhe querem reconhecer. Ou talvez não lhe sejam sensíveis...
Posso rir?
Nota: Acaba de receber
o prémio britânico para o melhor filme do ano (BAFTA)
PROPÓSITO
DE LLEWYN DAVIES (A) (Inside Llewyn Davis), de Joel e Ethan Coen (****)
Um mergulho, cheio de
fascínio, na Manhattan dos anos 60 e dos que sonhavam fazer carreira no mundo
da música. Sobre mais um dos seus “heróis” desastrados, a quem o sucesso não
sorri. Triste e melancólico mas com todo o brilhantismo cinematográfico
habitual dos manos Coen.
TAL
PAI, TAL FILHO, (Soshite chichi ni naru), de Hirokazu Koreeda (***)
Os reflexos das
mentalidades saídas das universidades
que formatam sem escrúpulos (à la crato) os jovens para as necessidades do
sistema capitalista, em famílias em crise ocasionada pelo funcionamento
desumano do sistema.
No estória do filme
trata-se de uma troca de bebés, que só anos depois é descoberta e de todas as
consequências que daí advém, a começar pelo hospital (privado) a querer fugir
às resposabilidades enquanto não arranjam um bode expiatório, e às famílias
postas perante uma situação inesperada e chocante.
(2-)O
QUE AINDA NÃO VI MAS QUERO VER (se for a tempo...)
NINFOMANÍACA
(Partes I e II), de Lars von Trier
Suponho que se trata
de mais uma provocação à von Trier, que fará simultaneamente as delícias de um
público burguês, ávido de cenas escandalosas e o protesto, escandalizado, dos
mais conservadores.
Do grande cineasta de
outras vezes pouco restará, a não ser, provavelmente, o seu “savoir-faire”. Ou daí talvez não. De
von Trier tudo se espera. Veremos.
QUANDO
TUDO ESTÁ PERDIDO (All is Lost), de J.C.Chandor
O meu interesse na
obra reside apenas no desempenho de um grande actor Robert Redford, já
veterano, com participações em grandes filmes, que aqui comete uma proeza de
representação, a crer nalgumas referências críticas.
Nesta obra é o mar que
se torna o obstáculo que se tem que
superar para não perecer, mas relembre-se a propósito outro grande
desempenho, inesquecível, deste notável actor (e também magnífico realizador)
em JEREMIAH JOHNSON (As Brancas Montanhas da Morte), de 1972, esse sim um
belíssimo filme dirigido por outro nome grande da Sétima Arte, o saudoso Sidney
Pollack. Então era o gelo e a neve que era preciso vencer para sobreviver.
VIDA
DE ADÈLE (A), de Abdellatif Kechiche
Kechiche, grande
cineasta, que já nos deu obras brilhantes, faz uma incursão pela diferença. De
certa maneira o seu magnífico “Venus Noire” já fazia prever uma evolução temática
na sua obra. Mas de risco elevado. Vamos ver como se sai.
20-Fev -2014
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