MEMÓRIA DE GRANDES OBRAS (1)
O MELHOR de CINEMA
e de OUTROS EVENTOS de CULTURA em 2006
Nº 36/06_10SET06
Conforme já várias vezes escrito, estes textos são uma mera justificação
de gosto, dirigida exclusivamente aos amigos, e não são CRÍTICA DE CINEMA!
Muito menos de Teatro…
"Pather Panchali" (A Balada da Estrada), de Satyajit Ray,
ÍNDIA, (1953) ***** (5)
O primeiro dos filmes da famosa "Trilogia
Apu", uma das obras-primas da cinematografia mundial, presente em quase
todas as listas dos melhores filmes de sempre. Premiado com a Palma de Ouro em
Cannes, em 1955.
Para mim será, juntamente com os outros dois que
constituem a trilogia que tem o nome do seu principal personagem – Apu, dos
mais belos filmes de sempre, e por vezes tão emocionantes, por nos fazerem lembrar
a realidade que nos cerca, e, às vezes, a nossa própria, que não se conseguem
ver sem que um nó nos aperte a garganta.
Não vos vou recontar a história, apenas lembrar que o
primeiro filme fala da infância de Apu, um garoto nascido numa remota aldeia da
província de Bengala, que vive com os pais muito pobres – Sarbajaya, a mãe, e
Harihar, o pai (que à noite escreve peças de teatro, depois do trabalho mal
pago, ou nem isso, porque lhe ficam a dever salários em atraso, que tem receio
de reclamar por temer que o despeçam), com a irmã um pouco mais velha, Durga, e
uma tia avó muito idosa, e narra-nos o início da difícil aprendizagem da vida
em tais circunstâncias, e terminando este episódio com a partida de Apu com os
pais, depois da morte da irmã e da tia, para Benares.
Cinematograficamente muito belo,
por vezes de um lirismo extremo, a que a música do grande compositor indiano
Ravi Shankar sublinha admiravelmente, utiliza com mestria a elipse (o
nascimento de Apu, a morte de Durga, por exemplo) sem que se perca a
continuidade da narração, como muito bem acentua José Manuel Costa, na
respectiva folha da Cinemateca.
Existem momentos no filme, repito, dos mais belos da
história do cinema – a cena da corrida dos dois miúdos através dos campos para
verem passar o comboio, a passagem pela aldeia do vendedor de guloseimas, a
tempestade, o regresso do pai, a cena em que Apu encontra o colar desaparecido. Para isso
também contribui e muito a excepcional interpretação, em especial das duas
figuras femininas principais – Sarbajaya (a mãe) e Durga (a filha), que são
aliás as figuras nucleares deste primeiro capítulo da história de Apu. ("A
primeira é o início da atenção privilegiada de Ray à mulher "no
casal" – tema dele, tema indiano e tema oriental – através duma personagem
que é já o reduto mais sólido de nobreza familiar", José Manuel Costa, na
Folha da Cinemateca).
Só para finalizar lembrar que Satyajit Ray (1921-1992),
nascido em Calcutá, viria a iniciar o seu percurso no cinema como colaborador
de outro grande mestre, Jean Renoir, na preparação de outra obra prima de
sempre "The River" (O Rio Sagrado), que o cineasta francês filmou
também em Calcutá.
Muito mais tarde, em fim de carreira, Ray haveria de
filmar, como sempre magistralmente, "A Casa e o Mundo", baseado no
famoso e inesquecível romance homónimo do grande escritor indiano Rabindranath
Tagore, filme que teve exibição comercial em Portugal (e então vimos) mas que
passou aqui quase ignorado!...
Os dois filmes que completam a Trilogia Apu, e ainda se
possível superiores a este, vão ser exibidos este mês na cinemateca (a 16 e
23), mas também legendados em francês!...
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