Cultura!

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OBJECTIVOS

Estes textos são uma mera justificação de gosto, dirigida em primeiro lugar aos amigos, e não são crítica de cinema, muito menos de teatro ou arte em geral... Nos últimos tempos são maioritariamente meros comentários que fiz, publicados principalmente no facebook ou no correio electrónico, sempre a pensar em primeiro lugar nos amigos que eventualmente os leiam.
Gostaria muito de re-escrever os textos, aprofundando as opiniões, mas o tempo vai-me faltando...
As minhas estrelas (de 1 a 5), quando as houver, apenas representam o meu gosto em relação à obra em causa, e nunca uma apreciação global da sua qualidade, para a qual não me sinto com competência, além da subjectividade inerente. Gostaria de ver tudo o que vale a pena, mas também não tenho tempo...

quarta-feira, 10 de agosto de 2016

DERSU UZALA, de Akira Kurosawa



Do que está em exibição na minha cidade, o que para mim será imperdível é o filme magnífico dos Irmãos Taviani, "Maraviglioso Boccaccio" e duas obras-primas absolutas, que são "Barry Lyndon", de Stanley Kubrick, e "Dersu Uzala", do mestre japonês Akira Kurosawa (Tóquio, 23-Mar-1910, Tóquio - 6-Set-1998), filmes que não deixei de rever.

Já falei dos dois primeiros e sobre o último só quero acrescentar que é, entre outras coisas, um hino à Natureza e à Amizade, que Kurosawa foi realizar na União Soviética, em 1975, antecedendo duas obras primas muito shakespearianas - "Ran" e "Kagemusha". 



Em 1993 Kurosawa realizou o seu derradeiro filme, um testamento fílmico humanista e maravilhoso, "Ainda Não!" (Madadayo).

"Dersu Uzala", apesar dos seus 140 minutos, passa num ápice porque o grande mestre tinha como poucos a noção de qual devia ser a duração ideal dos planos.

Interpretado por Maksim Munzuk (Mzhegyei, Tyua, Russia, 2-Mai-1910 - 28-Jul-1999, Kyzyl, Tyua), no papel do caçador mongol Dersu Uzala e Yuri Solomin (Chita, URSS, 18-Jun-1935), como Capitão Arseniev, também personagem real, em cujo relato Akira Kurosawa e Yuriy Nagibin (Moscovo, URSS, 3-Abr-1920, 17-Jun-1994) se basearam para escreverem o argumento desta obra-prima. 



Gostaria de lembrar outros aspectos desta obra, acima de tudo o respeito de um homem educado pela civilização mas suficientemente inteligente para compreender a enorme e insubstituível experiência vivida pelo seu guia, o caçador de martas, Dersu, um ser extraordinário, cujo respeito pela Natureza e pelos seres vivos, humanos ou não, é uma lição para os predadores humanos pretensamente civilizados. 
Referir as dificuldades atravessadas por ambos, em que a sabedoria do guia várias vezes os salva perante uma Natureza indiferente ao sofrimento humano e por vezes muito violenta. 
E da amizade baseada no respeito que cresce entre estes dois seres humanos.

Na pesquisa na Net, na tentativa de descobrir algum aspecto que me tivesse escapado mas considerasse útil referir, deparei com um belíssimo texto sobre o fime que não resisto em partilhar com a devida vénia, porque tudo o que pudesse acrescentar está lá.

(em outraspalavras.net/posts/por-que-rever-dersu-uzala/)



"(...)
Durante o desenrolar da história vamos nos apaixonando pelo pequeno mongol, que aos poucos mostra como é realmente. Aparece um homem simples, que vive livre na natureza, com pleno conhecimento do ambiente que o cerca. Mas, ao mesmo tempo, um ser temeroso das forças naturais, que não as compreende plenamente. Trata-se, na forma descritiva do diretor, do eterno embate entre o mito e a ciência, ou da razão esclarecida, já tão bem estudada pelos filósofos.
Dersu movimenta-se de acordo com suas tradições e o conhecimento adquirido em sua vivência diária. Arseniev orienta-se por seus livros e pelo que lhe foi transmitido nos bancos escolares e no exército. Dersu respeita o conhecimento do seu amigo, e o capitão se surpreende ao ver naquele homem atributos de alto valor de dignidade, honradez, solidariedade, coragem e determinação, aliados a sua extrema simplicidade. São qualidades cada vez mais esquecidas no mundo civilizado.
Opera-se então um equilíbrio entre os dois mundos e se abre, numa perspectiva rousseauniana, a tensão entre o “homem natural” e a “civilização”. Desenvolvido por Jean-Jacques Rousseau, em especial no seu Discurso sobre a Origem e Fundamentos da Desigualdade Entre Homens, mas presente também nas investigações de filósofos pós-modernos, o tema é de enorme atualidade. Contribui com a reflexão dos que procuram libertar o homem contemporâneo das cadeias impostas pelo reino da mercadoria — onde prevalece o desequilíbrio imposto por uma forma de ser se choca com nossa condição de ser integrado na natureza."




BARRY LYNDON, de Stanley Kubrick




BARRY LYNDON, de Stanley Kubrick (1975)

Ler no "AbrilAbril" um belíssimo artigo sobre este filme, a que pouco poderei acrescentar. (ver link a baixo)

Só duas ou três coisas que gostaria em todo caso de referir a propósito desta obra que, a quando da estreia, a crítica mais conservadora desprezou. Agora já lhes falta a coragem para isso...

1-Os grandes actores, dos principais aos secundários, incluindo quem tenha vindo de filmes do famoso grupo de rebeldes contra o "establishment", os Angry Men, e o enorme prazer que nos dá assistir à sua representação. 


2-A admirável cena do derradeiro duelo, em que à grandeza do gesto de Barry, perdoando a vida ao adversário, responde o aristocrata com o ódio frio dessa gente, com o seu ódio de classe que infelizmente conhecemos tão bem. E o que tem sido quase sempre o papel da Igreja (ou das igrejas) na luta de classes, sempre do lado dos poderosos, movimentando-se na sombra e influenciando, não é esquecido...

3-No final Barry é banido de Inglaterra e, dizem-lhe, que "vá viver para o estrangeiro!". E o estrangeiro para eles é a Irlanda que depois, a ferro e fogo, tentaram evitar (e em parte conseguiram) que se pudesse libertar e se tornasse independente...

4-Finalmente, quando a bela, mas quase destruída, lady Lyndon assina o documento da pensão a Barry, concedida a troco do afastamento deste, a data no documento é 1789, ano em que, do outro lado do canal, se daria a Tomada da Bastilha e a Revolução Francesa avançaria com a burguesia, com o apoio popular, a derrotar a aristocracia, e a monarquia a ser derrotada. O que ainda não aconteceu na Inglaterra e países que domina (Escócia e Gales) mas aconteceu na República da Irlanda!



5-Tudo o que este grande mestre da Sétima Arte fez não é por acaso e este filme é nesse aspecto admirável, constituindo uma extraordinária Obra-Prima!

AMIGOS, SE PUDEREM, NÃO PERCAM!













O ANO DA MORTE DE RICARDO REIS, de José Saramago, encenação de Helder Costa


Quando Setembro chegar ponham por favor nas vossas agendas uma ida à BARRACA, para ver a última e mais uma vez magnífica produção de A BARRACA, com a adaptação da obra de JOSÉ SARAMAGO, que muitos consideram ser a de que mais gostaram - O ANO DA MORTE DE RICARDO REIS. 
É de 1936 que se trata e de FERNANDO PESSOA e de um dos seus famosos heterónimos, numa genial recriação do nosso Nobel.


Creio que posso garantir-vos que se vão rir mas ao mesmo tempo relembrar com preocupação essa época difícil do nosso País, com o fascismo em ascensão aqui e em grande parte da Europa, com as suas atrocidades sem nome, os seus horrores aqui mesmo ao lado, na Espanha invadida e saqueada. 


Saramago, como genial escritor que foi, nunca se esquece de nos lembrar em que situações históricas viveram as suas personagens, reais ou imaginárias.
Interpretações brilhantíssimas, numa magnífica encenação de Helder Costa.

NÃO PERCAM!


E já agora leiam (ou releiam) essa obra-prima da nossa literatura e não só que é O ANO DA MORTE DE RICARDO REIS, publicada em 1984!