BALANÇO CINÉFILO DE 2016 - As minhas justificações de gosto
45 YEARS (45 ANOS), de Adrew
Haigh, com Charlotte Rampling, Tom Courtenay
"
O argumento do filme é baseado numa novela de um poeta inglês, David
Constantine (71 anos), que em entrevista disse que a ideia lhe tinha vindo duma
notícia que leu na adolescência, e que o tinha impressionado, sobre o corpo de
uma rapariga que havia sido descoberto praticamente
intacto, envolvido no gelo de um glaciar alpino.
Constantine e posteriormente Haigh
construíram histórias cujo maior interesse tem obviamente a ver com o
comportamento humano a partir da memória de um acontecimento que se julgava
definitivamente terminado e que um corpo conservado no gelo vem lembrar."
THE BIG
SHORT (A Queda de Wall Street), de Adam McKay, Christian Bale e Steve Carell
"Não será uma obra claramente anti-capitalista
mas antes uma denuncia dos excessos a que o capitalismo em crise, cíclica,
conduz, provocando milhões de vítimas, mas que para eles não passam de
números...
A obra, embora se limite aos especuladores menores,
que gravitam na órbita do sistema, embora às vezes enriqueçam, e praticamente
nunca nos mostre os que efectivamente comandam e ditam as decisões políticas
que permitem que tudo continue na mesma, não deixa de impressionar os
espectadores. Nem chegamos sequer a ver os émulos dos famigerados Constâncios e
Carlos Costas, a não ser em imagens fugazes
No entanto o filme vai dizendo meia dúzia de verdades
sobre quem acaba por pagar de facto as crises capitalistas, ou seja, os
trabalhadores e as massas populares. "
LA LOI DU MARCHÉ (A Lei do Mercado), de Stéphane
Brizé, com Vincent Lindon e Karine de Mirbeck
"O autor diz que o seu filme é apenas político no
sentido estrito do termo, mas que não quis fazer um panfleto ou uma bandeira da
luta de classes, mas apenas debruçar-se sobre um homem em crise, por ter caído
aos 50 anos no desemprego, não querendo no entanto perder a sua dignidade como
ser humano.
O filme mostra, através de vários episódios na vida
deste homem, o estado lamentável da sociedade resultante das políticas
neoliberais (em muitos aspectos espécie de fascismo). Não tenho tempo agora
para explicitar alguns aspectos a merecerem atenção mas que julgo que os
espectadores não deixarão de sentir, como por exemplo o da "selecção de
pessoal" nas empresas privadas. Aliás isso foi evidente na reacção dos
espectadores da sessão a que assisti."
CINZENTO E NEGRO, de Luís Filipe Rocha, com Joana
Bárcia e Flipe Duarte
"Vontade de rever esta magnífica obra, CINZENTO E NEGRO, tragédia de
contornos clássicos, que a crítica dominante desconsiderou.
De Luís Filipe Rocha, o grande realizador de, por exemplo, o famoso CERROMAIOR, em que adaptou a obra homónima de Manuel da Fonseca, o admirável escritor, poeta, narrador do País a Sul do Tejo.
Agora é principalmente a paisagem açoriana que domina, em especial do Pico
e do seu mítico vulcão.
Brilhante direcção de actores e actrizes. Joana Bárcia e Mónica Calle com
duas interpretações que ficam no nosso imaginário cinéfilo e isso nos tempos
actuais não é fácil de se conseguir, pelo menos para mim."
WHERE TO INVADE NEXT (E agora invadimos o quê?), de Michael Moore
"O famoso documentarista norte-americano, MICHAEL
MOORE, dá um panorama desolador do estado da democracia, dos direitos dos
trabalhadores e dos direitos humanos no seu país. (...)
Em especial o episódio da luta pelos direitos das
Mulheres é talvez o melhor momento do filme."
MARAVIGLIOSO BOCCACCIO (Maravilhoso Boccaccio), de
Paolo e Vittorio Taviani
"É a adaptação de um grande clássico italiano,
baseado nas histórias do seu DECAMERON, que Pasolini já havia adaptado também
brilhantemente, à sua maneira.
Em tempos de Peste (século XIV) há quem tente
fugir-lhe. Também nós agora, com novas pestes (o fascismo e o neo-nazismo
crescendo na Europa, na Turquia...) assolando os sítios onde vivemos,
precisamos de força para lhes resistirmos e fazer-lhes frente, porque não
adianta fugir...
É um maravilhoso filme dos manos Taviani a não perder,
transmitindo a beleza e sabedoria sobre a natureza humana, dos escritos de este
grande autor, como o nosso Gil Vicente, Shakespeare, Molière..."
SNOWDEN, de
Oliver Stone, com Joseph Gordon Levitt e Shailene Woodley
"Não só é excelente cinema, o
que Oliver Stone fez uma vez mais, mas é também uma obra de grande importância,
na denúncia da monstruosidade em que transformaram o seu país, os EUA, e dos
perigos que isso representa para a Humanidade.
Numa sala quase cheia o impacto
sobre os espectadores foi grande, assistindo em silêncio preocupado ao
desvendar da existência e acção de um sistema tentacular, que se abate sobre
todo o mundo, com raras excepções, podendo atingir quase tudo e quase todos,
onde quer que estejam.
E muitos, por falta de conhecimento
científico, nem se aperceberão verdadeiramente da gravidade do que está a
acontecer. Porque não se trata de ficção, é a realidade."
JULIETA, de Pedro Almodóvar, com
Emma Suárez e Adriana Ugarte
"Longe vão os tempos do estilo
frenético, que a crítica mais burguesa adorava, sob o qual se escondia já um
grande realizador.
O tempo vem dar-nos razão e é num estilo depurado que este grande cineasta nos oferece agora uma nova belíssima obra, comovente e brilhantemente interpretada, em que são os corações, através dos sentimentos, que batem por vezes descompassadamente
Almodóvar continua, a cada novo filme, a afirmar-se como um dos grandes autores do Cinema Contemporâneo."
O tempo vem dar-nos razão e é num estilo depurado que este grande cineasta nos oferece agora uma nova belíssima obra, comovente e brilhantemente interpretada, em que são os corações, através dos sentimentos, que batem por vezes descompassadamente
Almodóvar continua, a cada novo filme, a afirmar-se como um dos grandes autores do Cinema Contemporâneo."
CAFÉ
SOCIETY, de Woody Allen, com Seve Carell e Kristen Stewart
Mais uma pequena jóia que Woody Allen, o realizador,
escritor e músico de jazz, nos oferece. Para ver quase sempre com um
sorriso.
Talvez os diálogos sejam, como sempre neste autor,
algo complexos e rápidos, às vezes difíceis de acompanhar para quem tem que ler
as legendas, e exijam algum conhecimento por parte de quem os ouve, neste caso
até cinéfilo, mas, pela sua inteligência, dão-nos sempre muito prazer.
Gostei da piada sobre o judaísmo e o cristianismo! Só
não soltei uma gargalhada porque parecia mal... Boa!
I, DANIEL BLAKE
(Eu, Daniel Blake), de Ken Loach, com Dave Johns e Hayley Squires
Retrato doloroso do Reino Unido Século XXI (United
Kingdom), mas que é também o duma Europa capitalista, situação que está a abrir
caminho de novo, como nos anos 30 e 40 do século passado, a um populismo,
racista e xenófobo, que em geral conduz ao fascismo como forma última que o
capital tem de tentar controlar e esmagar as massas trabalhadoras.
LES BEAUX JOURS DE ARANJUEZ (Os Belos Dias de
Aranjuez), de Wim Wenders, com Sophie Semin, Reda Kateb, Jenz Harzer e Peter
Handke
"Não se pode esperar que esta recentíssima obra
de Wim Wenders, estreada no Festival de Cinema de Veneza deste ano, venha a ter
grande sucesso junto do público ou da crítica dominante.
No entanto trata-se de um filme belíssimo para quem
aprecie a chamada Sétima Arte.
É que Wim Wenders pegou num texto quase abstracto,
escrito para o teatro pelo dramaturgo alemão Peter Handke, seu velho conhecido.
E o resultado é puro fascínio, com os dois principais personagens, uma mulher e
um homem, Sophie Semin e Reda Kateb, conversando perante nós enquanto a câmara
se movimenta suavemente."
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