RECOMENDAÇÃO CINÉFILA
– DJANGO UNCHAINED (Django Libertado)
Quentin
Tarantino (Knoxville, Tennessee, EUA, 27-Mar-1963) regressa aos
grandes ecrãs dos cinemas lisboetas com outra excelente obra, com
argumento do próprio cineasta. Sobre a Escravatura nos EUA, a acção
do filme passa-se ainda antes da Guerra Civil (da Secessão)
(1861-1865), que alastrou pelo país até à derrota dos partidários
da escravatura. E em que, caso raro na filmografia sobre o tema, os
heróis são os escravos! E saiem vitoriosos no final...
Não
deixa de ser curioso olhar as recomendações dos críticos dos
jornais dominantes portugueses (DN e Público). É que as opiniões,
entre os críticos mais radicais, à direita, extremam-se entre o
muito mau e o excepcionalmente bom... Porquê? Se a primeira posição
parece lógica, aliás coincidente com posições claramente de
extrema-direita do crítico, a segunda, mais conotada com um
neo-liberalismo de fachada, aparentemente não será tão lógica.
O autor
de CÃES DANADOS (Reservoir Dogs), que foi a sua obra de estreia
(1992), e que espantou então a crítica no Sundance Film Festival
(conhecido festival de cinema, no Utah), também de PULP FICTION
(1994), a sua obra-prima e ainda da recente paródia anti-fascista,
SACANAS SEM LEI (Inglourious Basterds) (2009), que nos divertiu
apesar da sua deturpação histórica, volta ao “western”, por
vezes de uma violência extrema, daí provavelmente (além da
participação Franco Nero, no pequeno papel de um esclavagista que
se dedica à promoção de lutas de escravos) a razão das
referências, da crítica dos Media a propósito deste filme, ao
género conhecido por “Western Spahetti”, que os estúdios
italianos a certa altura produziram, com alguns bons resultados
(nomeadamente os filmes de um excelente cineasta, Sergio Leone e de
que Franco Nero foi um dos actores mais conhecidos). E também há
quem refira como outra referência, um nome célebre do cinema
norte-americano, o realizador Sam Peckinpah (1925-1984), em especial
no mais famoso dos filmes deste cineasta de origem índia (julgo que
o único grande realizador com esta ancestralidade), “Wild Bunch”,
em que a violência no ecrã atingia níveis raros. Julgo residir
aqui fundamentalmente a razão do tal incensamento por parte da tal
crítica atrás referida.
Mas, por
outro lado, a verdade é que não conseguimos ver DJANGO LIBERTADO
sem uma grande emoção, e isso é um grande mérito da realização,
por vezes brilhante, de Tarantino, que provoca a ira de quem vê
perante a realista reconstituição das atrocidades cometidas pelos
colonos do velho Farwest contra os escravos negros, e contra os
índios também obviamente (o que este filme não mostra). Indignação
que depressa atinge os níveis do ódio nos nossos corações, contra
esta abjecção humana que foi a Escravatura, em especial esta, a que
deu um contributo importante e muito sombrio do ponto de vista
humano, à história da formação dos EUA, à semelhança aliás do
genocídio índio.
No
entanto, Tarantino é também muito sarcástico quando mostra que
tudo se resolve se aparecer alguma perspectiva de grande negócio,
isto é, de muito dinheiro. E mesmo os mercenários da empresa
mineira, que transportam em jaulas os escravos negros, comprados aos
grandes fazendeiros e levados acorrentados para o inhumano trabalho
nas minas, escravos que só terão possibilidade de se libertarem com
a morte, esses mercenários também são tentados pela mira de ganhar
muito dinheiro (Tarantino aparece aqui como actor e não se livra de
apanhar um tiro mortal...).
As
semelhanças com a actual sociedade capitalista norte-americana
continuam a ser mais que óbvias, onde o dinheiro tudo permite, tudo
consente...
Não me
quero alongar por agora muito mais . Recomendar apenas que, a menos
que sejam muito impressionáveis, porque as reconstituições são
realistas, que não deixem de ver este filme.
E
recomendar ainda para repararem numa cena do filme, quando Django se
liberta dos mercenários que o pretendem conduzir para a mina, e
deixa aberta a jaula onde os seus companheiros de fuga aguardam.
Fizeram-me lembrar alguns compatriotas meus...
E, a cena
final, quando o último dos inimigos com que se depara Django (Jammie
Foxx) é Stephen (Samuel L.Jackson), o escravo que como paga da sua
subserviência e traições aos seus irmãos de classe, é promovido
a acólito do patrão, à semelhança de alguns que infelizmente
conhecemos...
As
interpretações são excelentes, como Christopher Waltz (no dentista
Dr.Schultz) e Leonardo DiCaprio (no fazendeiro Calvin Candie), este
com um excepcional momento quando debita o seu discurso da
superioridade da “raça branca”, ao melhor estilo nazi-fascista..
Digamos
que o tema de fundo da obra é a revolta, desta vez vitoriosa, dos
escravos contra os patrões esclavagistas ou negreiros se assim lhe
preferirem chamar. A essa revolta dos escravos negros nos EUA
faltou no entanto a organização protagonizada por outro escravo
famoso, Spartacus, que fez tremer o Império Romano, e que por isso
continua a ser um exemplo para todos os que lutam pela Liberdade dos
Povos.
No final
Django, e a sua amada, a bela Broomhilda (Kerry Washington) partem
livres. Aliás foi esta belíssima actriz que afirmou a propósito
do filme de Quentin Tarantino: “Quis fazer “Django” pelo meu
pai. Porque o meu pai cresceu num mundo onde não havia super-heróis
negros. E é isso que este filme é.”
(publicado no facebook em 24-Fev-2013)
EGAS BRANCO
ResponderEliminarMeu Caro,
Super-heróis negros, de todas as raças e, porque não, um super-herói comum?
Aprecio o seu gosto cinéfilo!
Um abraço
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 24 de FRevereiro de 2013
Caro Amigo,
ResponderEliminarAinda bem que diz isso porque se vir com atenção os meus filmes preferidos julgo que verificará que os meus heróis, nas Obras de Arte e por maioria de razão, na Vida, são afinal quase todos homens comuns!
O que não significa que não tenha uma grande admiração por aqueles, que por um motivo ou outro, mas sempre por grandes motivos devido ao seu sentido profundamente humano, se destacaram! Um abraço
Não resisto a partilhar um comentário que me foi enviado via e-mail (obviamente com a devida autorização do autor):
ResponderEliminar"Obrigado pelo teu comentário crítico de Django. Há muito tempo que não via um filme tão épico sobre os explorados. A noção que temos de escravatura nos EUA é a dos campos de algodão ou do trabalho doméstico.... abraço"
(José Dionísio)