“O
GEBO E A SOMBRA”, de Manoel de Oliveira (POR)
(publicado no facebook e "não publicado" no Cartaz de Cinema do "Público"/ Indeks)
De
cada nova obra do decano dos cineastas (a nível mundial, 103 anos) espera-se
sempre algo de muito pessoal, que ele nos queira transmitir, a nós espectadores
mas também provavelmente aos seus pares.
Embora esta peça de
Raul Brandão, “O Gebo e a Sombra”, contenha algo de contraditório: por um lado
um desespero quase niilista (estado de espírito que está a reaparecer entre
nós, neste início de século, perante o regresso da exploração mais selvagem,
dos mais pobres pelos mais ricos, nesta fase de refluxo dos direitos humanos em
mais um episódio da luta de classes, que essa mesma luta se encarregará de
corrigir mais cedo ou mais tarde); por outro lado uma exaltação da honestidade
(hoje cada vez mais rara entre as classes dominantes. Mas não terá sido sempre
assim entre os dessas classes?) e do espírito de sacrifício, apesar da sua
aparente inutilidade, já que só isso não chega, porque não elimina as injustiças. Terá sido isso que seduziu
Oliveira?
De
resto é como sempre o primado da voz e dos actores, em longos planos fixos, e
só por estes actores do nosso contentamento já valeria a pena ver este belo
filme, porque eles são magníficos, a interpretar os diálogos da peça de um
autor a que já chamaram o mais tchekhoviano dos escritores portugueses. Convém
no entanto lembrar outras das suas obras, de “Os Pobres” a “Húmus”, passando
pelos livros de viagens – “Os Pescadores”, ele que descendia de homens do mar,
até ao teatro, nomeadamente essa famosa tragicomédia “O Doido e a Morte” e
relembre-se que, ainda há pouco tempo, Alexandre Delgado, se serviu dela para
libreto de uma ópera e Joaquim Benite, encenou-a no teatro, do que resultou um
espectáculo conjunto que nos fascinou, até pela modernidade do texto.
Para
terminar desejava só lembrar uma frase chave no filme, porque Oliveira, e os
seus actores, também a sublinharam:
“Sofia (como quem
fala doutra coisa maior que a subjuga):
Mas se essas pessoas ricas lhe perdoassem?
Gebo: Perdoar o quê? O dinheiro, filha? O dinheiro nunca se
perdoa.”
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