“REDEMPTION” (REDENÇÃO), de Miguel Gomes (duração: 27’)
Não tendo previamente lido nada sobre o filme, o que prefiro se possível, em geral, para evitar preconceitos, confesso que até perto do final da obra, tentei compreender em vão o que nos queria transmitir o incontornável autor de “AQUELE FELIZ MÊS DE AGOSTO” e de “TABU”, duas obras de grande qualidade, mas que também tiveram, um raro sucesso de público e crítica, em Portugal e fora dele.
Que infâncias e juventudes eram aquelas, já assimilando o pior, parecia-me, e que justificações adultas eram aquelas outras, procurando ir à juventude encontrar justificações para o mau comportamento adulto?
De repente, porém, fez-se luz e tudo passou a fazer sentido. Com textos da autoria de Miguel Gomes e da sua co-autora, Mariana Ricardo, a constatação de quem eram os quatro personagens que os autores resolveram caricaturar, num acto de revolta suponho, imaginando-as quando crianças (Passos Coelho), jovens (Angela Merkel), ou recordando episódios juvenis (Nicholas Sarkozy e Silvio Berlusconi), conferiram clareza e coerência à obra, perante o que conhecemos do trajecto humano e político destes personagens na triste Europa em que vivemos. E um sorriso amargo despontou nos rostos dos espectadores.
Eles são afinal modelos (outros podiam ter sido os escolhidos – Cavaco, Durão Barroso, Blair, Aznar, Sócrates, etc, etc) de vários tipos de fazer política na área do neo-liberalismo, a nova forma que as classes dominantes encontraram nas últimas décadas de manter e aumentar os níveis de exploração dos trabalhadores e de condicionarem a luta dos povos pelos seus direitos, surgindo até entre esses políticos, e os seus porta-vozes, principescamente pagos na comunicação social, nos mais radicais de entre eles, o incitamento à repressão e à retirada de direitos fundamentais, duramente conquistados ao longo de gerações, como o direito inalienável em Democracia, que é o direito à greve.
Miguel Gomes imaginou, com algum humor sarcástico, e cáustico, o que, na infância e juventude desta gente, pode ter pesado nos homens e mulheres em que eles se vieram a transformar, para mal de todos nós.
Um documentário político, que não agradará obviamente a “gregos e troianos”. Ainda bem!
Um hiato no conjunto da sua obra, com o humor que todos lhe reconhecem.
Um protesto, com o seu quê de iconoclasta para a toda poderosa indústria do cinema, de um jovem cineasta português.
Um protesto também contra a incultura que grassa entre estes políticos e que põe em risco a própria indústria do cinema em países como Portugal. E muito mais, obviamente, o cinema como representação artística.
Sem comentários:
Enviar um comentário