De urgente visão, porque se trata de mais uma obra de arte de Mário Barroso e seus colaboradores, com principal destaque para o argumentista Carlos Saboga (que já havia sido responsável pela também magnífica adaptação de “O Milagre Segundo Salomé”, de José Rodrigues Miguéis), o músico Bernardo Sassetti, autor de grande parte da música do filme e os jovens actores, todos excelentes, alguns prometendo muito (Rita – Patrícia Franco, Simão – Tomás Alves, Mariana – Catarina Wallenstein). Quanto aos consagrados, são os grandes actores a que já nos habituaram no cinema, de Ana Moreira (Teresa) a Ana Padrão (Mãe de Simão), de Rui Morrison (Pai de Simão) a Virgílio Castelo (Pai de Mariana). E é de Beatriz Batarda a voz, magnífica, da narradora.
Este filme não tem de facto nada a ver com o cinema português que em geral por aí corre, comercial e sem qualidade, de A.P.Vasconcelos a Nicolau Breyner ou outros produtos ainda menores.
Adaptação livre ao século XXI, da obra-prima de Camilo Castelo Branco, cuja primeira edição data de 1862. Ao cinema já foi adaptada muitas vezes, sendo a versão mais conhecida e considerada a melhor, a de Manoel de Oliveira, em 1979. O filme de Mário Barroso, ao propor uma visão actualizada do romance, afasta-se completamente das anteriores adaptações.
Com a enorme sensualidade já presente na obra anterior do cineasta, mesmo que não mostre sexo, como é o caso. As insinuações incestuosas só aumentam a aura sensual da obra.
Magnificamente filmado, com algumas cenas de antologia – deambulações de Rita e Xavier, a cena da discoteca, as cenas entre Simão e Mariana, por exemplo (cito de memória).
O autor tem uma curta aparição no papel de Albuquerque.
Cinema português de qualidade superior, que não se deve ignorar.
E a propósito de cinema comercial versus cinema como arte, fez-me lembrar o laureado com o Prémio Pessoa deste ano, o arquitecto Carrilho da Graça, a quem ouvi em entrevista na rádio (na saudosa ex-RPL, ou agora Paris-Europa, salvo erro) definir com clareza a diferença entre Construção – o que invade (e às vezes, polui) as nossas urbes e Arquitectura – que se vê, infelizmente, apenas de vez em quando.
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“SINGULARIDADES DE UMA RAPARIGA LOURA”, de Manoel de Oliveira (POR), **** (4)
Uma pequenina jóia, por vezes de um brilho resplandecente, que quando acaba nos sabe a pouco. No final, os espectadores permanecem sentados, rendidos à magia de Oliveira, mas desejando mais, ou talvez pensando que a história poderia continuar… Adaptação no entanto quase perfeita, num pequeno filme de pouco mais de uma hora, do conto homónimo de Eça de Queiroz
Desfile de alguns dos actores preferidos do mestre (Leonor Silveira, Ricardo Trepa, etc) mesmo que em pequenos papéis ou apenas na leitura de um poema (Luís Miguel Cintra e o “Guardador de Rebanhos”, de Alberto Caeiro, heterónimo de Pessoa). A jovem Catarina Wallenstein, fazendo jus ao nome de família, aparece de novo aqui, depois do papel brilhante no filme de Mário Barroso, mostrando ser um nome a afirmar-se como um sério talento da nova geração de actores.
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